Resenhas

Diablo Motor - 2018 - Inflama

Por André BG | Em 06/05/2018 - 15:03

Fonte: Imprensa Monstro


 

 

Texto por Wilfred Gadêlha

 

Num mundo em que os rótulos ganham cada vez mais gavetinhas, é uma satisfação perceber que existe gente pegando de tudo para fazer uma coisa só. Sem pudor, sem preocupação de ser hipster ou querer agradar só pelo prazer da fama. É o caso do Diablo Motor, em Inflama.

 

O novo disco do quarteto pernambucano formado por Filipe Cabral (voz e guitarra), Lucas Reis (guitarra), Bruno Patrício (baixo e vocais) e Thiago Sabino (bateria) é um disco de rock. Um belo de um disco de rock, como tem que ser: ardido, pra cima, feito para ser tocado em um lugar escuro e cheio de fumaça.

 

Com as guitarras de Cabral e Reis servindo de bússola, o Diablo Motor enfia o pé no acelerador logo na entrada. Vai de 0 a 200 em questão de segundos, com Ultimato, uma canção que reúne dois Pages: o do Helmet e o do Led Zeppelin, como se fossem apenas um. O resultado, tendo a voz principal entoando uma levada quase que xamânica, é uma viagem que emenda rapidinho na segunda faixa - Réquiem -,  já entrando num clima mais intimista, meio cabaré de periferia, com a distorção se segurando para explodir na hora certa.

 

A terceira faixa merece um parênteses: lembra da "coisa só" que eu falei no começo? Pois é, então imagina um rock pesado com metais. Chiou? Só se tu for besta, porque Mais Que Três é uma música do caralho. Com a bateria de Thiago Sabino chamando a responsa para si, com uma levada "solta-os-cachorros", Filipe Cabral canta mais rasgado enquanto o desbravador Maestro Spok destila sua sutileza frevo-jazz-soul com seus saxofones, deitando na cama que Nilsinho Amarante (trombone) e Fabinho Costa (trompete) prepararam. Não saia do recinto antes de sacar também a percussão gentil da multiartista Lara Klaus. 

 

Depois do Carnaval, vem a Quarta de Cinzas. Ingrata como ela só, faz-se sentir necessária, na melancólica Anti-Zen, na qual as vozes são como clarins. A própria letra, irônica e cínica, traz essa carga dramática. Filipe fala sobre os velhos fantasmas e recebe de volta o sofisticado retorno da cantora Raíssa Leal (Red Dust). Quando cantam juntos, revelam aquilo que eu já disse: uma harmonia, um entrosamento, uma coisa só.  O sintetizador triste de Cadu Bussad é o fecho com chave de ouro.

 

Casarão, assim como Ultimato e Mais Que Três, saiu em single. Ela retoma o ritmo de inferninho com riffs mais largados, minimalistas, que se repetem, hipnotizam, com mais referências à velha magia que encanta gerações desde que Elvis rebolou pela primeira vez na televisão. Com direito a letra em algarismo romano, V chega com o baixão de Bruno Patrício na cara, falando alto, cuspindo no chão e, ainda assim, seduzindo quem passa no caminho.

 

Daí, você se pega lembrando da fase Ronnie James Dio do Black Sabbath quando Vietnã começa. Mas então, quando pensa que a banda vai seguir o caminho mais metal, não: ela surpreende e te chama para a dança, com mais uma guinada: a danada fica progressiva, com Filipe Cabral puxando a sardinha para sua brasa e fazendo o que um bom guitarrista deve fazer: ir junto com a música. O sintetizador de Piero Bianchi ajuda a formatar um lance meio Kashmir, meio Perfect Strangers. Ou seja: quem tem a diabólica trindade dos anos 70 como influência, tem tudo.

 

O mais foda de Inflama, que sai pelo selo goiano Monstro Discos, é que ele "passa" rápido. Quando você dá fé, chegou a última faixa: Minha Sede, um rock duro, mas calibrado com doses de sintetizador (Cadu de novo!), serpenteando ao mesmo tempo por caminhos que Josh Homme adoraria ir se não tivesse brigado com John Garcia.

 

Inflama mostra um Diablo Motor mais envenenado, mais sacana, um Keith Richards mais pesado, que sabe o que faz, mas não deixa a aura de rebeldia para trás. Ponto para o produtor Iuri Freiberger, que soube conduzir, estética e sonoramente, o quarteto no estúdio.

 

Inflama cumpre a sua missão. É um álbum que realmente esquenta as coisas e dá, ao mesmo tempo, a oportunidade de você parar para prestar atenção ao que os caras fazem. O Diablo Motor é uma banda pronta. Não se espante se cruzar com eles nas estradas poeirentas desse Brasil afora. E, se tiver essa chance, aproveite. Porque vai valer a pena.

 

PS: Inflama sai primeiro nos serviços de streaming. Pega agora o teu celular e procura. Depois, será lançado em K7 e, mais pra frente, em vinil.

 

Confira!!

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Foto: Gustavo Carvalho

 

Wilfred Gadêlha é jornalista, autor do livro Pesado - Origem e Consolidação do Metal em Pernambuco e roteirista do documentário Pesado - Que Som É Esse Que Vem de Pernambuco?

 


André BG



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