Rock Brasileiro nos anos 70 - Parte 02
O ano seguinte seria um marco em grandes eventos e festivais (dadas as proporções do público existente), além de bons lançamentos e novos nomes surgindo no cenário.
Logo em janeiro, o empresário Nelson Motta surge com o projeto “Hollywood Rock”, realizado no campo do Botafogo, no Rio de Janeiro. Foram 4 fins de semana de som, cada um deles com atrações diferentes. O primeiro, em 11 de janeiro, teve como atração principal Rita Lee & Tutti Frutti. No dia 18 (coincidindo com o segundo dia do Festival de Águas Claras em Iacanga), estavam previstas apresentações do Veludo e dos Mutantes. O público era de aproximadamente 18.000 pessoas. Após a apresentação do Veludo, os Mutantes sobem ao palco e logo são recepcionados por uma tempestade de verão, que destruiu o palco e acabou com a apresentação. Isso prejudicou muito a banda, que teve equipamentos danificados e os tirou da apresentação no Festival de Águas Claras (eles iriam direto do Rio para Iacanga, após o show). No dia 25, as atrações eram O Peso, Vímana e O Terço (que tinha tocado em Iacanga no fim de semana anterior). O Vímana foi prejudicado por uma falha no som durante parte do show e os dois outros shows levantaram a moçada. O derradeiro concerto da série recebeu dois artistas já históricos de nosso rock – Celly Campelo e Erasmo Carlos, além do emergente Raul Seixas. Existe um “falso” registro em áudio de parte do festival, com as músicas de estúdio das bandas que se apresentaram, acrescidas de barulhos de platéia, e um registro raro em vídeo (chamado “Ritmo Alucinante”), infelizmente com baixa qualidade de som e imagem, de alguns trechos dessas apresentações, que pelo menos vale pra se ter uma idéia d’O Peso e do Vímana no palco. Houve tentativas da parte de Motta para levar o evento a outras capitais mas não deu certo. A ditadura encrespava muito com eventos ao ar livre e houve problemas com a marca de cigarros Hollywood, que patrocinava o evento.
Na TV, na mídia impressa e no rádio o rock também crescia. A rede Globo apresentava o programa “Sábado Som”, que estreou em março de 74 e foi até fevereiro de 75, deixando a moçada maluca com vídeo-tapes de grandes bandas da época e registros de seus concertos – Pink Floyd, Black Sabbath, Mahavisnhu Orchestra, Allman Brothers, Humble Pie, Johnny Winter, etc. O Veludo foi a única banda nacional a aparecer no programa. No rádio, despontava com crescente sucesso entre a moçada a Rádio Eldorado, no FM, mais conhecida como Eldo Pop. O FM era novidade na época e a Eldo tocava material até então inédito no país, principalmente do rock progressivo e hard-rock contemporâneo (não só inglês e norte-americano, mas de vários outros países, inclusive som das bandas locais), sem locuções e com pouquíssimos intervalos, numa longa viagem sonora. A rádio começou em fins de 72 e durou até 78, pouco tempo depois da morte do famoso disc-jóquei Big Boy, que era quem conseguia o fantástico material que a rádio veiculava e era seu principal programador. Deixou como legado uma imensa legião de órfãos que a cultuavam e que até hoje pesquisam nomes de algumas músicas que tocavam na programação, já que não eram anunciadas enquanto tocavam. Em São Paulo, grande repercussão tinha o programa Kaleidoscópio, apresentado diariamente nas madrugadas por Jacques do Kaleidoscópio. Em uma rádio católica, Jacques botava pra quebrar com muito rock n’ roll e entrevistas, que o público podia assistir no próprio auditório da rádio. Como revistas de grande circulação, havia a Hit-Pop (antes chamada de Geração Pop) e a Rock: A História e a Glória, que além de anunciarem as novidades lançadas no Brasil e no mundo, encartavam pôsters de bandas que despontavam na época e traziam algumas resenhas e entrevistas.
No mesmo janeiro de 75, rolou o maior festival ao ar livre da época no Brasil, o Festival de Águas Claras, em Iacanga (interior de SP). Uma festa muito louca, com muita lama e curtição, que reuniu alguns dos maiores nomes do período e outros menos famosos no circuito nacional. Foram 3 dias, com instalações pouco adequadas para os presentes e equipamento rústico para os músicos, em termos de som e iluminação. Lá se apresentaram bandas já consolidadas no cenário como O Terço (a única que se apresentou no Hollywood Rock e em Águas Claras e foi o encerramento da programação), Moto Perpétuo, Apokalypsis, Soma, A Barca do Sol, Som Nosso de Cada Dia e Terreno Baldio. Tocaram também Rock da Mortalha, Orquestra Azul (que abriu o festival), Jazzco, Ursa Maior, Burmah, Mitra, Tony Osannah e mais alguns no lado mais rock e no lado MPB houve Jorge Mautner, Walter Franco, Grupo Capote (de Odair Cabeça de Poeta) e Marcos Vinícius, entre outros. Este festival atraiu boa cobertura da mídia impressa do Brasil, pela grande proporção que teve e também pelo desbunde total que foi. Existe um documentário sobre o festival (e suas outras três edições, em 81, 83 e 84) sendo preparado desde 2008 com previsão de ser lançado neste ano (vamos aguardar!).
Vale aqui uma pausa para falar das bandas que tocaram lá e que não tem (até hoje) nenhum registro em disco. O Rock da Mortalha é um grupo lendário da cena brasileira, porque, segundo relatos, seu som era extremamente pesado. Era um hard rock vigoroso, na linha de Black Sabbath. Os membros da banda, formada na periferia de São Bernardo do Campo, tocavam fantasiados e utilizavam algumas temáticas obscuras e fantásticas em suas letras. Existem relatos conflitantes e desencontrados a respeito da banda e até recentemente surgiram gravações de um ensaio do grupo (com péssima qualidade sonora, infelizmente) em que realmente percebe-se como o som era pesado. Mas há pessoas que conheceram pessoalmente a banda e seus membros que relatam que o som dos caras não era nada daquilo, e que o material poderia até ser de uma outra banda. Tiveram várias formações e estiveram ativos até o fim dos anos 70, já indo numa direção mais heavy metal. Controvérsias a parte, os músicos que faziam parte da banda na época de Iacanga (eram eles Orlando Luí no baixo, Baccas na guitarra e Julinho na bateria) já morreram (ou sumiram) e fica essa lacuna sobre a história do grupo. Também eram acompanhados eventualmente (o que não aconteceu no show de Iacanga) de um dançarino, chamado Lola, que era italiano e fazia performances teatrais durante os shows no período. O Soma era carioca e a história da banda começa em 1969, com Bruce Henry, jovem norte-americano que veio morar no Brasil em 66.
A banda começou com Jaime Shields (guitarra e vocal), Alírio Lima (bateria) e Ricardo Peixoto (guitarra). Nesta época, gravaram compactos que saíram na obscura coletânea “Barbarella”, de 71. Pela falta de repercussão do material, deram um tempo e só voltaram em 74, sem Ricardo Peixoto e com a inclusão de Ritchie Court, o mesmo flautista e vocalista inglês que tinha integrado o Scaladácida. O único registro que se tem da banda neste período é a música P.F, que saiu no disco do espetáculo “Banquete dos Mendigos” organizado por Jards Macalé em comemoração aos 25 anos da declaração dos direitos humanos. Gravaram também a trilha sonora de um filme sobre o famoso ladrão Ronald Briggs, mas nem o filme nem o disco chegaram a ser lançados e se perderam no tempo. A banda era bastante requisitada na época e foi gradativamente ficando mais jazzística, tendo encerrado as atividades no fim dos anos 70. O Burmah era um grupo brasileiro-argentino, com origem relacionada à banda El Reloj. Tocaram em duas das mais importantes ocasiões do rock naquele ano – Águas Claras e Banana Progressiva. Sua formação era Norton Lagoa (contrabaixo, o único brasileiro no grupo), Eduardo (guitarra) e Piojo (bateria). O Jazzco (ou JA2Co) era uma espécie de “brass-rock” na linha de Chicago e Blood Sweat and Tears, com muitos naipes de metais e assim como o Burmah, tocaram em Águas Claras e na Banana. É valioso citar, já que estamos falando de bandas das quais não existem registros, do grupo Spectro, de São Paulo. A banda começou em 73, nos arredores de Campinas, capitaneada pelo tecladista e multi-instrumentista Amyr Cantúsio Jr, que conseguiu gravar vários bons trabalhos a partir dos anos 80, ativo ainda na atualidade na linha do progressivo eletrônico (sendo um dos pioneiros no Brasil neste território). Hoje circula por aí uma gravação bastante amadora de ensaios do grupo no período, que tem valor histórico, dando uma idéia de como era o atmosférico rock progressivo do grupo.
Uma outra banda celébre na época e que não deixou registro oficial em disco era o Veludo. Formados no Rio de Janeiro, a banda era figurinha carimbada nos eventos da capital fluminense e seus shows eram arrebatadores, segundo relatos de quem os viu. Surgiu inicialmente em 72, como Veludo Elétrico, contando com Lulu Santos na guitarra e vocal (com 19 anos na época), Fernando Gama no baixo, Paul de Castro na guitarra, Elias Mizhrai nos teclados, entre vários outros músicos que participaram de suas formações. Do Veludo Elétrico surgiu o Veludo, núcleo com Elias e Paul e o Vímana, com Lulu e Fernando. O Veludo fazia um som progressivo numa linha mais ousada e um pouco mais experimental do que os Mutantes e o Terço, em composições longas, com improvisações e instrumental muito energético. O tipo de som que faziam foi considerado inviável e pouco comercial e não conseguiram um contrato para gravar, na época, a despeito de ter um grande público cativo e sempre serem aclamados em apresentações pelos teatros e festivais. A banda teve como formação clássica Elias Mizrahi nos teclados, Nélson Laranjeiras no baixo, Paul de Castro na guitarra e Gustavo Schroetter (ex-Bolha e futuro A Cor do Som). Paul era multi-instrumentista (tocava também baixo, violino e flauta) e em 76 passou a integrar os Mutantes, como baixista. A banda alternou períodos ativos e inativos, recentemente lançou um trabalho de estúdio e atualmente tem feito alguns shows, inclusive no exterior, capitaneados por Elias Mizrahi. Em 1998, uma luz surge sobre a obra do Veludo. Um fã da banda prensou, por uma louvável iniciativa própria, 2000 cópias em CD de uma parte da apresentação da banda no Festival Banana Progressiva, também de 75, com um qualidade de som razoável. Um grande presente aos ouvintes do bom rock progressivo da época e que mostra bem o calibre da banda no palco. Duas ocasiões antagônicas marcaram a trajetória do Veludo. A primeira, foi a imensa vaia que tomaram do público ao abrir o show de Bill Halley & His Comets no Rio de Janeiro. Também pudera – claro que não ia pegar um som cabeça e elaborado para abrir um show de música para dançar, de um artista já quase fossilizado e totalmente vinculado a um passado até então recente (anos 50), apesar de seu imenso valor histórico. A idéia dos promotores de escolher o Veludo é que foi infeliz (algo similar as infelizes “misturas” que os eventos do Rock in Rio eram pródigos em fazer). E o famigerado Ezequiel Neves, grande crítico da estética progressiva, detonava sua metralhadora giratória:
“O grupo do guitarrista Paul de Castro desaprendeu de forma chocante sua eficaz receita de rock-blues. Agora o Veludo entrou para o rol do som bolo de noiva, marca registrada do Terço, Mutantes, etc... Tudo de uma chatice sem limites. A competência instrumental a serviço da bobagem. O tecladista não pode ser pior e mais pomposo. Temas fantásticos totalmente jogados fora, sufocados por improvisações totalmente desprezíveis. O Veludo mereceu mesmo a vaia acontecida no Maracanãzinho antes da abertura do show de Bill Haley. O fato do Veludo, o Terço e os Mutantes estarem conscientemente batendo com a cabeça na parede, me deixa com pena é da parede“
A banda, pouco antes do show de abertura, vê a debandada de Gustavo Schroetter, substituído por Aristides (que participou de importantes apresentações do grupo dali em diante), e teve uma canja de Patrick Moraz (então tecladista do Yes) no show. A outra ocasião foi gloriosa, e ocorreu no Festival Banana Progressiva. A banda aportou em São Paulo e deixou embasbacados todos os presentes. A expectativa quanto ao show era grande por parte da banda e, querendo chamar mais a atenção, os músicos bancaram um anúncio no jornal “Folha de São Paulo”, anunciando sua apresentação no evento.
O outro “braço” do Veludo Elétrico (Lulu Santos e Fernando Gama) juntou-se aos remanescentes do Módulo Mil (Candinho, baterista, e Luiz Paulo Simas, tecladista) e fundaram a banda Vímana em 74. O som do grupo tinha muito de progressivo, mas tinha também um tempero brasileiro com bastante swing. Em 75, Candinho se manda da banda por motivos religiosos (ingressando em uma seita oriental) e a banda acolhe o flautista e vocalista Ritchie Court e o baterista João Luís Woenderbarg, mais conhecido como Lobão. Em 75 participam como banda de apoio em gravações da cantora Luiza Maria e do cantor Fagner. No período passaram a se relacionar com o tecladista Patrick Moraz, apaixonado por nosso país tropical e que já andava por aí fazendo som com várias bandas locais (O Som Nosso de Cada Dia em Sampa e o Veludo no Rio). Patrick queria que o Vímana fosse sua banda de apoio no projeto do que viria a ser seu disco solo “Story of I”. Houveram vários desentendimentos entre Patrick e a banda. Ao mesmo tempo em que a moçada ficou deslumbrada pela possibilidade de uma carreira internacional e de tocar ao lado de um músico que já era referência em rock progressivo, ficaram tolhidos pelo gênio difícil do tecladista suíço e por seus desmandos. Patrick viu que a coisa não ia dar pé, a banda estava totalmente insatisfeita com a parceria e cada um foi para o seu lado. Só em 77 é que a banda entraria no estúdio para gravar. Gravaram pela Som Livre (já uma grande gravadora na época), com a produção de Guto Graça Melo, um disco que ainda não viu a luz do dia (quem sabe um dia!), sobre a alegação de que não havia público no Brasil para aquele tipo de som. Só existe disponível até o momento um compacto, com as músicas “Zebra” e “Masquerade” e mais algumas gravações de shows da banda, com pouca qualidade sonora. Contribui para o fato de a gravação permanecer engavetada o interesse quase nulo dos ex-integrantes da banda pelo antigo material, já que quase todos eles seguiram a trilha da música pop nos anos seguintes (Lulu Santos, Lobão e Ritchie) com bastante sucesso.
A Banana Progressiva foi outra maravilhosa reunião da nata rock brasileira e da MPB relacionada ao rock. Projetada para ser um evento multicultural (com música, exposições de artes plásticas, fotografia e cinema) e para acontecer como uma temporada, aconteceu de fato no Teatro da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, em março, organizado pela Trinka Produções, produtora que já organizava diversos agitos na capital paulista. Foram 4 noites de evento, começando numa quinta-feira. Na abertura do festival se apresentaram Veludo, Quarto Crescente (há outra banda com este nome nos anos 80, da qual fez parte o vocalista Percy Weiss, sem relação com esta), Bandolim e Som Nosso de Cada Dia. O segundo dia do evento foi a vez do grupo Montanhas, Edson Machado & A Rapaziada, Vimana e Burmah. Na noite seguinte, subiram ao palco Biscoito Celeste, A Bolha, Manito (já saído do Som Nosso de Cada Dia, se apresentando como artista solo) e Erasmo Carlo e CIA. Paulistana de Rock, um supergrupo que o Tremendão montou na época para acompanhá-lo. E por fim, o domingo teve uma seleção maravilhosa de shows com Hermeto Pascoal, Barca do Sol, Jazzco e o Terreno Baldio. A Banana Progressiva foi noticiada na época e musicalmente malhada pela crítica jornalística, que acusava os grupos de não terem originalidade e usarem fórmulas mal-copiadas de grandes grupos ingleses. O Festival foi bem sucedido em termos de público, porém a idéia de seguir como uma temporada de eventos menores não se firmou da maneira como a Trinka gostaria, rolando outras temporadas no Opus 2004 e no Teatro Bandeirantes, todos em São Paulo.
Em termos de discos lançados, o grande destaque fica com a guinada progressiva do grupo paulista Casa das Máquinas. Com a entrada do tecladista Mário Testoni, a banda envereda fortemente para um som mais elaborado e lança o maravilhoso disco “Lar de Maravilhas”, um dos trabalhos mais representativos do rock progressivo do Brasil na época. Como já dito anteriormente, a banda já era bem profissionalizada, vinda do bem-sucedido núcleo d’Os Incríveis no fim dos anos 60, com bons equipamentos e uma certa experiência na lida fonográfica. O disco se saiu muito bem em vendas por conta da faixa de abertura “Vou morar no ar”, uma canção um pouco mais acessível comercialmente falando, que acabou entrando até como trilha sonora de novela da Rede Globo. O tecladista Mário Testoni também foi responsável posteriormente pela guinada ao progressivo da banda Pholhas. Outro marco no rock brasileiro foi o primeiro (e único) disco da banda O Peso. Formada a partir da dupla Luis Carlos Porto e Antônio Fernando, vindos de Fortaleza para o Rio concorrendo com a música “O Pente” no FIC de 72, a banda registrou em 75 o disco “Em busca do Tempo Perdido”, com um rock básico, rasgado e pesado, com influências de blues-rock. A formação que gravou o disco e fez vários shows no período era Luís Carlos Porto (vocal), Carlinhos Scart (baixo), Gabriel O’Meara (guitarra), Constant Papineu (teclado) e Carlos Graça (bateria). O grupo, desiludido pela falta de sucesso e queimado com os empresários pela arruaça que provocava por onde passava, encerrou as atividades após dois anos na estrada. Os músicos do Peso se integrariam novamente nos idos de 76-77 com a banda Flamboyant, que contava com Gabriel, Papineu e Carlinhos, além de Zé da Gaita (que tinha participado do disco do Peso, tocando na faixa “Blues”) e o famoso Celso Blues Boy na guitarra. Chegaram a acompanhar Raul Seixas em alguns shows, mas não gravaram nada. Rita Lee & Tutti-Frutti foram a sensação daquele ano, com dois lançamentos de bastante sucesso – “Entradas e Bandeiras” e “Fruto Proibido”, ambos com hits que até hoje fazem parte do repertório dos shows de Rita Lee. O Terço atingia grande magnitude com as vendas do disco “Criaturas da Noite” e se lançara na tentativa de alcançar mercados internacionais. Gravaram uma versão em inglês deste disco que foi lançada na Itália, com algumas mudanças na mixagem da parte instrumental que não ficaram boas. Acabaram não tendo o resultado obtido, porém conseguiram algumas incursões em países vizinhos. Aqui, seus shows eram muito concorridos e a banda era um dos maiores nomes do rock neste período.
Não só no circuito Rio-São Paulo as coisas estavam acontecendo. Em Porto Alegre, a agitação começou a partir da Rádio Continental, com o apresentador Julio Furst, que apresentava um programa patrocinado pela marca de calças jeans Lee. Esse cara, após ser convidado para atuar como jurado no festival universitário Musipuc, resolve apostar nas bandas locais. Julio propõe a rádio oferecer espaço para gravações semi-profissionais (em dois canais) para as bandas que participaram do Musipuc e outras que surgissem, para rolar em seu programa. Porto Alegre praticamente não possuía estúdios profissionais na época. A direção da rádio em princípio hesitou e colocou o risco do fracasso do projeto nas costas de Julio. Mas o cara seguiu com a idéia e a coisa deu certo, auxiliando as bandas na divulgação do som e levando aquela música a uma amplitude maior dentro da região Sul. As bandas gravaram lá e as músicas rolavam no programa de Julio, que tinha grande audiência. E a partir disso começaram a surgir os eventos da rádio, com as bandas que tocavam no programa se apresentando nos palcos, principalmente da capital gaúcha. Vieram a tona nestes eventos bandas que ainda hoje permanecem obscuras, por não possuírem registros oficiais (fora os gravados na rádio), como o Byzarro (grupo de hard-progressivo), Inconsciente Coletivo (folk-MPB), Mantra (jazz-rock), Élbia (rock n’ roll), Utopia (folk progressivo) entre outros. Outro grupo importante da cena gaúcha na época era o Saudade Instantânea, que segundos relatos, tinha uma linha de som parecida com a dos Mutantes (fase progressiva). A banda, formada em 72, era capitaneada pelo guitarrista Cláudio Vera Cruz, que viria a integrar o grupo mais famoso vindo da região sul na época, o Bixo da Seda (sobre o qual falaremos em seguida). A banda participou de vários eventos e esteve envolvida com teatro, criando trilhas sonoras para alguns espetáculos. Um de seus maiores feitos foi abrir o show dos Secos & Molhados em Porto Alegre, em 73. Na região nordeste (principalmente em Recife), acontecia um certo levante psicodélico-regional, que começou por volta de 72, com gente do calibre de Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Lula Côrtes, Marconi Notaro, Zé Ramalho, Fagner, Ednardo, Ave Sangria, Quinteto Violado, Flaviola, entre outros. Em 75, é lançado um marco fonográfico dessa geração, que adquiriu o status de cult em nível mundial – o disco Paêbiru, de Lula Côrtes e Zé Ramalho. Um trabalho que levou à estratosfera a mistura de música regional nordestina com o espírito psicodélico de experimentação e muita loucura. Gravado em fins de 74, o disco possui certa controvérsia em sua aura, por ter se tornado uma raridade muito rapidamente. A versão mais difundida para isso é a de que uma enchente abateu o depósito da gravadora Solar, onde estavam os discos recém-prensados e grande parte do material se perdeu nessa ocasião. Outra versão diz que a gravadora decidiu parar de prensá-lo devido ao alto custo (um encarte bastante caprichado acompanhava a edição original) e as baixas vendas. O que resta hoje é um legado maravilhoso desta obra, considerada recentemente como um dos discos mais valiosos (pelo valor musical e pela raridade) gravados no Brasil.
Aconteceram ainda vários eventos ao ar livre no Parque do Ibirapuera e no Parque da Aclimação, em São Paulo, e no MAM do Rio, além da sonzeira que rolava na Tenda do Calvário em São Paulo. Em Curitiba, aconteceu o I Festival Rock de Verão, que contou com as bandas Rita Lee e Tutti Frutti, Som Nosso de Cada Dia, O Terço, Bixo da Seda, Almôndegas, entre outros.
E por fim, o ano se encerra com as apoteóticas apresentações do mago dos teclados, Rick Wakeman. Foram 5 apresentações no país – duas em São Paulo, no estádio do Canindé (dias 13 e 14), uma em Porto Alegre, no Gigantinho (dia 18) e duas no Rio de Janeiro, no Maracanã (dias 20 e 21).
Ronaldo Rodrigues é Colaborador Esporádico